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9 - Arrependimentos (parte 1)

Frederico Peçanha - 2075

Na verdade eu já sabia que isso aconteceria. Eu sabia que ele estava se preparando pra atacar, eu sabia de tudo. Só esperava que ele me provasse o contrário, que nem toda a minha família fosse se voltar contra mim. Primeiro meu irmão, sem ao menos saber, toma de mim a coisa que eu mais quis nessa vida e depois meu pai entra na minha cidade, rouba todos os meus pupilos, corrompe meu chefe traficante e mata um terço dos meus homens! Reagrupando, depois de todo esse dano, vou ter que interromper meus planos de atacar São Paulo simplesmente por falta de contingente pra manter a cidade! Aquilo seria uma porra de uma mina de ouro e ele tirou isso de mim. Isso sem falar na minha mãe, que descobriu quem eu sou e parou de falar comigo por completo nos últimos 6 meses de vida. Olhando pra trás, me parece que eu só tive e tenho de verdade duas pessoas na minha vida. Isabela e Letícia. Minha letícia, minha irmãzinha genial que decidiu investir o talento dela em trabalhar na maquinaria que mantém o mundo se movendo. Desde programar robôs a processar dados de levantamentos ecológicos, ela é parte da equipe que se denomina “a liga dos druidas” e criou as florestas artificiais da liga, que balancearam as emissões de gás carbônico no planeta. Ela acabou se tornando uma guardiã do mundo, já que é responsável pelos aparelhos que o mantém respirando. E Isabela, minha princesa guerreira sorrateira! Vem e vai quando quer, e você nunca sabe de fato quando ela virá com seus feitiços. Desde matar um inimigo meu que eu sequer sabia que existia até colocar aquela lâmina nano-afiada no meu pescoço pra me relembrar que ela pode acabar comigo. Ela não me encantou à primeira ou á segunda vista, como Liana, mas não posso negar que ela me conquistou. Com aquele intelecto poderoso, aquele jeito que ela tem de adivinhar meus pensamentos e já dar palpites sagazes...

- Então você já acordou, bebê chorão? - Isabela falou entrando no quarto com uma bandeja
- Isabela? O que você faz aqui, moça? - respondi
- Vim cuidar desse bebê chorão aí. Tava resmungando enquanto dormia e até chamou o nome da liana.
- Porra, pra que você vai falar dela agora?
- É pra te relembrar de algumas coisas. E tem uma, aliás, que eu sabia e nunca te contei.
- Ta falando do que?
- Da Liana, idiota.
- Deixa a menina descansar em paz, Isa. Já se passaram décadas.
- Ela tinha outro. Não era o Emanuel, esse. Era outro.
- Como assim? Você por acaso tem provas disso?
- Sim, claro. Diálogos virtuais rastreados e dois encontros inteiros gravados. Eu preferi nunca te falar isso, porque você precisa de foco, mas hoje decidi falar.
- E era uma relação parecida com a que ela tinha comigo ou com o Emanuel?
- Nem de perto, cara. Ela obedecia esse cara, era até meio cômico. Ele fez alguma coisa com ela na cama que deixou a menina louquinha. Era engraçado de ver, porque ele era bem pobre. Na verdade ele nunca soube de você, passou a trabalhar pra você e foi morto ontem á noite nesse Blitzkrieg que fizeram contra você. Por isso que me lembrei agora.
- Mais um vestígio dela se apagando do mundo...
- Quer ver algo da interação deles?
- Francamente? Não. Ela me ensinou muita coisa, mas não foi ativamente. Ela fez comigo o que eu fiz com o mundo: usar diferentes tipos de poder pra influenciar e controlar as situações. Você precisa antes ser vítima pra depois aprender a ser algoz.

Eu falava enquanto comia aquele pão com carne moída e bacon que ela inventou com 15 anos e eu aprendi a amar. Temperos artificiais carcinogênicos eram seu toque de amor e nostalgia. Difícil acreditar que alguém conseguiu passar tanto tempo sendo parte da minha vida. Quando terminei, ela puxou aquela mesma faca e subiu em cima de mim.

- Você lembra dessa faca? - ela disse
- Lembro.
- Então me conta a história dela.
- Quando eu te rejeitei sob a alegação de que você era nova demais, você mandou fazer essa faca do tamanho do meu pescoço e planejou me degolar da garganta até a nuca, mas acabou me seduzindo no processo.
- E você nem ligava de verdade pra eu ser tão nova, seu pervertido!
- Eu ligava pra não ser esmagado pelo seu pai!
- É, eu nunca perguntei mas imaginei. E o que te convenceu?
- Foi a sua faca mesmo. Você entrou na minha casa sorrateira, subiu na minha cama e pôs a faca no meu pescoço. Lembra daquela cena?
- Lembro. Eu fiquei te olhando e saboreando o que deveria ser o seu medo. Mas você tinha desejo no olhar e eu fui ficando confusa.
- Quando você me beijou, eu me senti a pessoa mais poderosa do mundo. Você demonstrou que era mais do que uma menina invadindo a minha casa e provou que podia tirar a minha vida!
- Então você devia se sentir fraco!
- Mas como? Se você me beijou ao invés de me matar! Se você me amou ao invés de me odiar?
- Amou? Estamos ficando românticos agora?
- Eu quis dizer outra coisa, Isa, para de graça. Você tinha todo o poder de me destruir e ainda assim escolheu se entregar pra mim e ser minha naquela noite. Aquilo mudou tudo. Eu tava disposto a correr o risco de seu pai me matar por aquilo.
- Pensando bem, sua primeira gozada foi até rapidinha pro seu padrão! Bobinho apaixonado, você!
- fala sério, aquilo foi praticamente um filme pornô, Isa. Lolita sexy te acorda, te domina e te seduz. Tá se sacanagem!
- hahahahaha! Lolita? Seu doente!

Ela apertou a faca contra o meu pescoço e fez aquele sorriso meio escondido pra mim. Desceu devagar e sua franja caiu nos meus olhos, que se fecharam. Ela selou o quarto e fez parecer que era noite. Mesmo de olhos fechados eu percebi. Estava recriando nosso momento, como sempre faz. Mal sabia ela que cada momento era um novo e que ela nunca precisou me fazer reviver nada. Eu enlouqueci e quis tomá-la nos meus braços, mas ela apertou a faca no meu pescoço.

- Que graça é essa, Fred? Tá achando que pode tudo agora?

Então eu abri os braços na cama e deixei ela me beijar. Era a única mulher que eu deixava beijar meu pescoço daquele jeito. Aquela pele macia que ela manteve idêntica com o passar dos anos por tecnologia fazia seu corpo pressionado contra o meu parecer que era a primeira vez. Aquela mesma voz, aquele mesmo cheiro. E eu era completamente incapaz de me enfastiar. Quando você encontra o milagre de estar com uma pessoa que sempre te surpreende em vez de te decepcionar, tudo parece como se fosse a primeira vez independente de quantas vezes se repita. Movi minhas mãos devagar, do jeito que eu sabia que ela gostava. Com ela você não pode se apressar em tomá-la. É como uma égua selvagem que você precisa domar com bastante calma e sob o menor deslize ela te derruba. Minhas mãos chegaram na sua cintura e ela se contraiu na hora. Depois de todo esse tempo, ela ainda custava a se entregar pra mim. E me surpreende que, com seus escravos, ela nunca tenha tido essa resistência toda. Segurou meus pulsos contra o colchão e me olhou seriamente

- O que difere os fortes dos fracos, Fred?
- Fortes buscam poder para realizar mudança. Fracos buscam poder para impedí-la. Fortes são empreendedores revolucionários, fracos são velhos lobos sentados em tronos de mentira.
- De onde vem o poder, Fred?
- Da paixão e do ódio...
- Look me in the eye and show me your hatred!

Eu vi aqueles olhos brilharem. Aquele calor, aquele cheiro que nunca me cansaram e aquela estranha capacidade de tomar o que há de pior em mim e transformar em grandeza acaba me transformando no mais poderoso dos escravos. Acompanhei a mudança no planeta ocorrida no século 21, entendi como as dinâmicas de poder mudaram e me aproveitei delas, mas sempre foi impossível entender que tipo de relação de poder eu e Isabela tínhamos. Com ela, me sentia o homem mais poderoso do mundo, com uma chama sempre acesa e quase dependente daquela voz de menina que ela insistia em conservar. Ela me tinha na mão, e, por escolha própria, se entregava e me empoderava. Já enlouqueci tentando entender o que ela quer de mim, todas as minhas ofertas parecem banais, mas ela consegue alguma coisa insondável e se dá por satisfeita. Mulheres...!
Subi em cima dela e rasguei suas roupas. Ela sorriu, puxou meu cabelo da nuca quase ao ponto de arrancar todos os fios e me puxou pra si. Um beijo cheio de paixão e cheio de ódio. Não havia naquele quarto qualquer tipo de restrição. Eu queria que ela me mostrasse sua força, e lhe mostrava a minha. Cada um de nós amava a ideia de que o outro podia arrancar-lhe a cabeça num segundo. Ela nunca largava aquela lâmina, que já não se posicionava em posição ameaçadora. Como sempre, nosso beijo foi ficando mais profundo, e nossas “agressões”, foram se acabando, restando apenas a ternura. Nosso bom e velho transe, tudo o que eu precisava. Não há momento mais seguro. Beijei todo seu corpo e ela largou a sua “murder weapon”, como ela chamava. Era completamente inconcebível que eu realizasse sexo oral em alguma mulher além dela. Talvez fosse só uma questão de gratidão, talvez eu só estivesse tentando convencê-la de ficar um pouquinho mais. Quando ela empurrava minha cabeça pra baixo como fez, não havia como resistir. Seus comandos eram ordens e ela sempre encontrava um jeito de comandar que eu fizesse tudo o que eu mais queria. O ritmo consistente, o movimento suave com a língua, tudo como lapidamos no decorrer dos anos, demonstrava como, no decorrer do tempo, eu me moldei pra satisfazer apenas ela. Tão monógamo que soa doentio! Ela puxava meu cabelo e se contorcia violentamente até o último momento. Não sou nenhum indulger, claro, mas me orgulhava daquele pequeno poder que ela tinha me dado. Quando gozou, quase esmagou minha cabeça entre suas pernas. Também trocou seus músculos pelos aprimorados e se meu crânio não estivesse reforçado, aquilo poderia mesmo ter me matado. A ideia de que ela podia não saber se eu sobreviveria me fascinou completamente.

- Mensagem de “Anonymous 9957” - disse meu computador

Somente meu hacker sabia desabilitar meu sistema de privacidade, então previ que seria importante a mensagem.

- Leia a mensagem em formato de áudio - respondi

“Chefe,
Essa mensagem é um resumo do arquivo em anexo, que é um relatório automático detalhado que foi realizado sobre as ações do traidor. Como você indicou ontem a noite em sua mensagem deixada dentro da câmara, alguém sabotou nossas defesas. Nossos sistemas mecânicos e biológicos de detecção e contenção de ameaças foram seriamente sabotados. De fato, todos os nossos radares de paradigma antigo foram desalinhados de maneira precisa e inutilizados e nossas armas biológicas em treinamento foram soltas enquanto as treinadas ficaram presas, também por sabotagem mecânica. Esse ataque não foi planejado pra falhar e encontramos o sabotador. É o Raime. Sinto muito. Dentro do relatório seguem todas as provas necessárias”

- Caralho, Raime!? Ele trabalha pra você a mais de 30 anos e você tirou ele da miséria pra fazer dele um milionário!

Lembrei de todos os nossos momentos e de toda a lealdade que eu esperava dele. Sua traição era imperdoável. Decidi, naquele momento, que era o momento de eu mostrar meu mais novo brinquedo aos meus associados.

- Convocar assembleia geral de altos executivos. Auditório principal, dentro de duas horas. Abrir caixa de mensagem para segurança Rio 1. Mensagem segue: “busquem capturem e transportem Raime pro auditório imediatamente.” Mensagem terminada, enviar.

Deitei olhei pro teto. Eu não queria ter que fazer aquilo. Se ao menos Raime soubesse do meu verdadeiro poder, nada disso teria acontecido. Era minha obrigação fazer dele um exemplo, e foi o que decidi fazer. Era difícil, no entanto, encontrar forças pra fazer o necessário.

- Show them your hatred, my prince. - Disse isabela com olhar consternado, porém raivoso.

As duas horas se passaram rapidamente mal percebi os minutos esvaindo enquanto preparava tudo com ela ao meu lado. Antigamente ela falava mais e fazia perguntas, mas com o tempo foi ficando cada vez mais silenciosa. Ela me acompanhou, deu algumas dicas que me pouparam tempo e não fez nenhuma pergunta. Cada dia mais engenheira! Sentou-se na primeira fila e assistiu o espetáculo.
O auditório tinha várias cadeiras vazias e nele reinava absoluto silêncio. Cada um sabia seu lugar e todos estavam bem informados sobre o recente ataque, mesmo que só pela mídia mainstream. Estavam me esperando.
Fiz o upload das provas contra Raime enquanto ele era amarrado na cadeira especial. Todos leram em silêncio por algum tempo até alguns começarem a protestar e amaldiçoar Raime.

- Seu filho da puta, você matou o meu pai!
- Você é um homem morto...!
- Voce vai sofrer!
- Antes de mais nada, passo a palavra pro nosso condenado. Que ele tenha suas últimas palavras.

A cadeira de raime se moveu e se fez maca, permitindo a ele a dignidade de falar de pé.

- Passei anos e mais ano nessa escravidão e não há futuro. Eu não tinha como ir embora. Se isso aqui acabasse, eu ganharia dinheiro suficiente pra comprar minha estadia em Marte. Esse planeta sobrevive com a ajuda de aparelhos e eu sabia dos riscos quando vendi vocês. Alguma coisa deu errado, não sei o que foi, mas isso não me importa de qualquer forma. Eu prefiro a morte a seguir vivendo a vida que eu levava, que já não fazia mais nenhum sentido sem minha família.

A plateia berrava com ódio. Era o momento de saciar a todos. Ordenei o silêncio erguendo a mão direita com punhos cerrados.

- Tudo aquilo porque lutamos, tudo aquilo que construímos, foi posto em risco por Raime e seus aliados do Leste Europeu. Essa crise diplomática acaba de se fazer guerra. Mas antes, temos que lidar com esse cão traidor. Seus cicatrizadores já foram removidos e ele não pode evitar a dor. Cada um de vocês que desejar pode vir aqui e bater nele como quiser.

Um a um, os homens foram se levantando e vindo para o palco. Cada um expressava sua raiva. A maioria se queixava das mortes que ele causou, mas alguns ainda mencionavam a irracionalidade, a loucura do que ele fez. A cada vez que um homem terminava, cicatrizavamos a pele dele por fora, pra ele não perder a consciência ou a sensibilidade. 180 executivos das quatro cidades o espancaram, mas um deles se recusou a bater e me pediu o direito de falar, que concedi.

- Socos e chutes não bastam. Neuralizem ele! - o homem gritou com os olhos arregalados
A plateia gritou como um ser só. Levantei o punho e criei o silêncio.

- Pra esse verme eu tenho algo pior do que a neuralização. Produzir demência nele é um ato de misericórdia, porque em um minuto ele já não teria nenhuma consciência. Vejam esse capacete na cabeça dele! É o Mind Flayer... - falei com orgulho

Todos começaram a pesquisar, mas não encontraram nada correspondente à peça de tecnologia ali apresentada, que era exclusiva da família Peçanha, cortesia do meu pai, que nunca desconfiou que eu tive acesso à arma.

- Esse nome fui eu quem dei, então não tentem encontrá-lo na nuvem, porque não conseguirão. É tecnologia exclusiva nossa. Por um sistema de deslocação espaço-temporal, campos magnéticos induzem a atividade cerebral em áreas do cérebro envolvidas nas sensações de dor e medo, provocando as duas sensações rapidamente e sem a necessidade de incisão no tecido cerebral. Mas isso não é a melhor parte. Esse capacete aumenta dramaticamente a atividade imaginativa do alvo. Em suma, ele produz alucinações que, comprovadamente, estão diretamente associadas à dor e medo e que são vividas o bastante pra que a pessoa siga sentindo as duas coisas como fruto de sua própria mente mesmo depois de desligado o aparelho. Então o aparelho torna a ampliar a dor e o medo por ressonância, que se soma à dor causada pela alucinação. Isso forma ciclos em que a dor e o medo vão aumentando. O aparelho ainda está associado à cadeira, que é na verdade uma antiga maca com dispositivos pra controle de pressão arterial, impedindo que o alvo morra por enfarte ou acidente cardiovascular. Essa ferramenta, literalmente, mata o alvo quebrando seu espírito. Não estou sugerindo nada sobrenatural, mas apenas usando uma forma econômica de descrever fatos: com o organismo intacto, o alvo simplesmente morre sem que se possa encontrar nada em seu corpo que justifique sua morte. Uma morte, literalmente, psicológica. E é o que tenho a oferecer a esse cão imundo.

Raime fechou os olhos e a plateia parecia não piscar. Eu tinha todos exatamente como queria. Uma tela do acima de mim mostrava os sinais vitais dele. Liguei o aparelho e Raime começou a gritar um segundo depois. Seus berros se faziam mais altos pelo silêncio no auditório.

- Não, Pai. Eu to queimando, para! - Raime gritava, já fora de si.

Suas cordas vocais começaram a ceder, mas ele não parou de gritar pelos 15 minutos que o processo durou. Por causa da aparência aterrorizada de algumas pessoas da plateia, decidi desligar o aparelho e soltá-lo da cadeira. Ele caiu da cadeira e ficou se contorcendo e rolando no chão por mais uns 10 minutos até que cedeu e morreu. Depois de um minuto, me voltei à plateia.

- Alguém tem alguma sugestão sobre o que fazer com o corpo?

O executio de Marketing de Curutiba 1, que ficou ali mesmo no palco comigo e havia sugerido a neuralização, se pronunciou.

- Devemos exibir o corpo dele em público pra deixar nossos inimigos saberem que estão desmascarados e que vamos atrás de cada um daqueles miseráveis!

A plateia gritou e tomei a mão esquerda do executivo e a ergui.

- É unanimidade! Reunião encerrada. Se preparem pra guerra!

- Caralho, como você arrumou isso? Liga? Eu não vi isso no catálogo deles! - isabela falou depois que todos saíram.
- Não, isso é relíquia de família. Walter puxou uma jogada política e forçou meu pai a produzir uma arma com base nas pesquisas do meu pai. Ele produziu essa arma, disse que nunca a fez e deixou guardada. Eu mesmo tomei a liberdade de testar e monitorar o efeito dela, que era um protótipo conceitual. A tecnologia por trás dela é coisa que já existe a mais de 100 anos, mas a forma como as ondas são lançadas, os ângulos, o tempo em que se alternam, tornam o negócio brilhante. Eu não sabia que meu pai tinha tanto talento pro Terror. Ele rapidamente saiu da liga depois desse projeto, Agora vaga por aí, provavelmente se lamentando e se culpando por todas as mazelas do mundo em busca de um passado que nunca retornará. Mas ele deixou um legado...
- Mas não seria conveniente manter essa arma escondida?
- Nunca. Perdi boa parte dos meus menores de idade e agora o percentual de membros que não foram endoutrinados desde os 4 anos de idade aumentou consideravelmente. A lealdade desses membros é mais condicionada pelo medo do que pela fé e Raime poderia dar ideias a outros. O relatório mostra comunicações que Raime fez, mas também mostra como ele nos sabotou. Eles precisam saber que nossas cidades têm fraquezas, mas que se me trairem, vão sofrer o que Raime sofreu.
- Porque dar esse poder a eles?
- Eu não dei poder nenhum, Isa. Pelo que Raime fez e pelo que eles sabem sobre nossas defesas, nós deveríamos ter sido aniquilados ontem a noite. Quando estudarem o relatório e perceberem que não deveríamos ter sobrevivido, entenderão porque é uma má ideia me trair.

Isabela ficou em silêncio por um tempo e vestiu seu casaco.

- Que isso, sério que você já vai embora? - protestei
- Sem sexo dessa vez. Mas saiba disso. Minhas 5 cidades estão à sua disposição e essa guerra também é minha.
- Que isso, isa! Você vai perder muito recurso assim!
- Deixa eu me preocupar com os meus recursos. Você sempre esteve presente pra mim. Mesmo em ausência, se certificava de que eu estava bem. É uma questão de orgulho.

Ela beijou meu pescoço e foi embora. Fiquei olhando pro corpo de Raime. Eu nunca deveria ter dado a ele tanto poder. Quanto do antigo Fred morreu junto com esse cara? No fim do dia, sua morte me fez triste. Agora os momentos que vivi com ele e Liana estavam entregues ao esquecimento, porque eu seguiria distorcendo as lembranças sem ter ninguém que me corrigisse. A morte dele acabou sendo também a morte de parte de mim.